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Nosso Bolo-Fetiche é Inglês! - Sandra S.

Desde 1946, e por iniciativa da noiva da foto, um bolo muito particular virou presença obrigatória em todas as comemorações da família, de seus amigos e agregados.


Em Itaperuna, a pequena cidade onde moravam meus avós maternos e seus quatro filhos, as novidades chegavam pelas mãos dos que vinham de fora. E quem tinha antenas, apetites e curiosidade, captava, adotava, adaptava. Minha família era dessas.


Contam que Amélia, uma jovem capixaba, recém-chegada na cidade, ensinou à noiva como fazer o bolo inglês, esse clássico também conhecido na França como Quatre-quarts, porque os ingredientes têm peso igual, mas o inglês leva um toque de vinho do Porto ou de Moscatel de Setúbal .


Amélia desenhou e executou o projeto do bolo de quatro andares, fez os confeitos, usou todos os seus dotes aprendidos no Espírito Santo a favor da boa causa. O casamento era caprichado, a noiva, vaidosa. E como somos um povo de improvisadores, o recheio, à défaut de melhores opções, foi uma deliciosa goiabada! Sucesso total.


Virou o bolo oficial de todas as festas, e ganhou novos recheios, sabores e coberturas. Lucélia, outra amiga que foi viver com o marido nos Estados Unidos, o que nos anos 40 era um feito extraordinário mesmo para quem não morava em Itaperuna, trouxe de lá a cobertura, o marshmallow americano, só que feito com calda de açúcar no lugar do xarope de glicose de milho. A irmã da noiva, que sonhava alto, sugeriu um recheio mais refinado, o de ovos moles e nozes. E o bolo inglês do casamento de 1946 foi se transformando. Mais tarde, não sei se por influência da fábrica de leite Glória que ali se instalou, ou por palpite de alguém que queria aderir à praticidade da vida moderna, o recheio passou a ser feito com leite condensado e nozes, quer dizer, brigadeiro branco e nozes.


Se você quiser fazer o bolo inglês, essa prata da casa, e pra ninguém botar defeito, siga as instruções:


bata 250g de açúcar (na batedeira elétrica, velocidade alta) com 250g de manteiga em temperatura ambiente, e uma pitada de sal, até formar um creme. Acrescente 6 gemas, uma a uma. Junte um cálice de vinho do Porto.


Peneire 250g de farinha de trigo com uma colher de sopa de fermento em pó. Junte à massa, mas use uma colher de pau para incorporá-la ao creme. Divida a massa em três. Acrescente três colheres de sopa de chocolate em pó a uma delas. Unte as formas com manteiga e polvilhe-as com farinha. Asse em forno a 180 ˚C, por uns 30 minutos.


O recheio de leite condensado é simples como brigadeiro. Uma lata de leite condensado vai ao fogo com 3 gemas, uma colher pequena de manteiga. Quando o fundo da panela começa a aparecer, tira-se do fogo. Junte as nozes que foram ligeiramente tostadas para que desprendam todo o seu aroma. Recheie o bolo com generosidade. As três camadas, branca, preta, branca, serão intercaladas por duas de recheio.

Para a cobertura, prepare um merengue italiano, que é o nome verdadeiro desse marshmallow. Leve ao fogo uma xícara e meia de açúcar com meia xícara de água. Espere até que as bolhas que vão se formar com a fervura diminuam de tamanho: é o ponto de fio. Bata as claras em neve até que formem bicos de ave, como se diz no jargão dos confeiteiros. Verta a calda quente sobre as claras em neve, deixando-a escorrer junto às paredes da tigela, sempre com a batedeira ligada na velocidade máxima. Seu merengue está pronto. Deixe bater mais um pouco, só para confirmar a consistência.


Espalhe o merengue nas laterais e no topo do bolo com uma espátula ou faca molhada em água fria. Depois, com uma colher de café, em giros delicados, vá formando os biquinhos. Ou dê umas grandes rodadas com a própria espátula, encontre seu jeito.


Quando pequena, com um paladar ainda muito restrito, lembro-me de catar as nozes e deixá-las na borda do prato. Às vezes, com os filhos pequenos, até fazíamos a versão infantil, sem nozes, que não tem a menor graça, diga-se de passagem, mas atendia às demandas idiossincráticas de alguns mais chatinhos.


Em todas as grandes cerimônias familiares, em todos os ritos da nossa história, foi servido o bolo inglês. Minhas primas o chamam de “bolo da mamãe”, e eu estranho, porque, pra mim, também é o bolo da mamãe, da minha mãe, embora tenha sido sempre, por justiça, originalmente o da minha tia e madrinha, a que – ao partir o seu bolo de casamento – dividiu e multiplicou suas fatias. Hoje, é bolo da vovó, da bisa…


E, acho que estarão todos de acordo, não é mais um segredo de família: sirvam-se, e façam com que seja também o seu bolo da mamãe. Afinal, agora é open source, para que estejamos alinhados com a vanguarda.










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